Arquivo da categoria: Samba

Apaixonado (1973) – Baden Powell

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capa1. Casa Velha
2, Alcântara
3. Igarapé
4. Estórias de Alcântara
5. Waltzing
6. Lembranças
7. Abstrato
8. As Flores
9. Balantofe
10.Brisa do Mar

A música brasileira está repleta de casos em que artistas fizeram mais sucesso fora do que no próprio país. Um exemplo dessa anomalia é o vilonista e genial Baden Powell, carioca nascido na década de 30, ano em que começava a ditadura Vargas no país, e período em que o samba ainda sofria na mão dos moralistas institucionalizados. Baden apareceu junto à bossa nova, movimento nascido em fins da década de 50 e que tomou grande proporção e fama na década seguinte. Detalhe interessante é que a bossa nova – mesmo com muito sucesso no Brasil – foi um dos movimentos musicais que mais aconteceu a tal anomalia do “santo de casa não faz milagre”.

Baden inicia-se junta a bossa mas, é um dos responsáveis por transformá-la e reiventá-la. Isso ocorre na segunda metade da década de 60, onde a denominada “segunda geração” do movimento (Eumir Deodato, Hermeto Pascoal, Edu Lobo e  Baden, dentre outros) conduziram-na à outros caminhos, intermediando um papo “mui bueno” com outros ritmos. Em Apaixonado, disco de 1973 (de um Baden bem maduro) isso fica evidente, pois os temas compostos por ele, vagam de pés firmes por toda música do mundo. Em toda singeleza que lhe é peculiar, notamos muita música brasileira: samba, frevo e bossa (claro!), envenenada pela música negra do mundo: o jazz, já existente em sua obra, pitadas de rock e blues, e dos recém nascidos soul e funk. (Interessamte notar a presença desses ritmos na música de Baden, mostrando quão antenado era um dos maiores guitarristas brasileiros).

Pra ouvir esse belíssimo disco. clique aqui! 

Chorume da Alma (2011) – Pig Soul

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Capa1. Intro (11)3142212X
2. Chorume da Alma
3. Koentro
4. Raño
5. Romanza
6. L’Amour
7. Wa A Api Vini
8. Cocktail
9. Epílogo
10. Talking Waves

O release do Pig Soul, banda residente de São Paulo capital, já diz tudo: “Vale tudo. Da improvisação livre à nerdice dodecafônica e espectral. Tudo com a veia roquenrol dos integrantes, ligados ao Progressivo e ao Metal. É jazz, é salsa, é louco. Acima de tudo é Rock!” Resume bem: é louco e acima de tudo é rock! Um rock pesado, recheado de experimentações da primeira à última faixa. Em tempos que as bandas de rock tem postura e produção mais preocupadas com a imagem que a sonoridade, o Pig Soul leva o rock à outros terrenos, digamos que mais…fritos! Viaja com o jazz, rebola com o samba e mexe com a salsa mas, sem perder a ternura.

A banda paulistana é formada por músicos experientes que tocam ou tocaram (juntos ou não) em outros projetos mui interessantes – o Eletrogroove, banda formada em Campinas e que tem dois integrantes que hoje formam o Pig Soul é uma delas. Em 2011, lançaram seu único registro até então, o disco Chorume da Alma. As composições são densas e vagam com tranquildade nos ritmos citados. O “espírito de porco” de Daniel Brita (guitarra e trombone), Gustavo Boni (baixo), Luiz André “Gigante” (bateria) e Rafael Montorfano “Chicão” (sintetizador e piano) incorporou e remexeu a caxola no rock.
Pra ouvir essa pedrada, clique aqui!

Percepção (1972) – Eumir Deodato

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capa1. Dia de Verão
2. A Grande Caçada
3. O Sonho de Judy
4. Adeus Amigo
5. Bebê
6. Nenê
7. Barcarole
8. Serendipity

Eumir Deodato dispensa comentários e apresentações. Um dos músicos e arranjadores mais aclamados da música popular – mesmo fazendo mais sucesso nos Estados Unidos do que no Brasil – começou sua carreira na década de 60 junto à bossa-nova, que  na época vivia seu auge e também fez parte da importante transição da bossa nova para o samba jazz em fins da década de 60.  Sempre como músico e arranjador, foi nessa condição que foi para os Estados Unidos como contratado da CTI Records, trabalhando com grandes nomes da música do país como Aretha Franklin e Frank Sinatra.

Chancelado como um músico talentosissímo, a partir da década de 70 começa a lançar seus discos solo. O primeiro dessa fase foi Percepção, gravado no Brasil pela gravadora Odeon, em 1972. Podemos dizer que é um disco abre-alas para o trabalho solo de Eumir Deodato. Percebemos em Percepção a influência da música produzida por ele na década de 60: bossa e samba jazz, fazendo elo com o que produziria nos Estados Unidos na década de 70: um jazz fusion e funk de responsa. Esse diálogo de períodos distintos é feito por melodias e aranjos de cordas e metais suaves, que nos levam a sensações nostálgicas e bucólicas. Se essa foi a intenção de Deodato (como parece ser, devido a bela capa do álbum) ele conseguiu com maestria. Belo disco!
Pra ouvi-lo, clique aqui!

A Hora e A Vez da M.P.M. (1966) – Rio 65 Trio

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capa1. Cartão de Visita
2. Deve Ser Bonito
3. Simplesmente
4. Apelo
5. O Amor e o Tempo
6. Vem Chegando a Madrugada
7. Chorinho “A”
8. Upa Neguinho
9. Rio 65 Trio Tema
10. Ilusão à Toa
12. Ponte Área
13. Seu Encanto

Formando na década de 60 com a proposta de sincretizar a música brasileira, principalmente a bossa nova e o samba com o jazz, o  Rio 65 Trio lançou poucos discos (dois), mas teve importância grande no processo de transformação e solidifcação dos ritmos brasileiros. Com músicos sensacionais como o pianista Dom Salvador, responsável posteriormente a ser um dos primeiros compositores do funk brasileiro da década 70; Edison Machado, exímio instrumentista que fez a bateria brasileira ser reconhecida pelo mundo, e pelo pulsante baixista Sérgio Barroso, A Hora e A Vez da M.P.M. é o segundo e último disco da carreira do trio, formado no Beco das Garrafas, no Rio de Janeiro.

A tal “M.P.M”. é sigla para “Música Popular Moderna”, e diz muito sobre a sonoridade que o trio incumbiu-se de fazer. Com apenas uma composição de um dos integrantes, a “Rio 65 Trio Tema”, de autoria de Dom Salvador, os músicos fizeram versões modernas e intensas de diversos clássicos da música popular brasileira, como “Upa Neguinho” de Edu Lobo e Gianfrancesco Guarnieri, imortalizada na voz de Elis Regina; “Apelo” de Baden Powell e Vinicuis de Moraes e “Vem Chegando a Madrugada” de Noel Rosa e Zuzuca, além de gravarem outros compositores importantes como Marcos Valle, Zé Keti, Jhonny Alf e Carlos Lira. Disco interessante pra percebermos a transição da música popular brasileira ocorrida na década de 60, adicionando à ela elementos da música mundial.
Pra ouvir essa pérola, clique aqui!

Rio 65 Trio (1965) – Rio 65 Trio

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capa1. Meu Fraco é Café Forte
2. Preciso Aprender a Ser Só
3. Farjuto
4. Desafinado
5. Sonnymoon For Two (Blues em Samba)
6. Espera de Você
7. Mau Mau
8. Tem Dó
9. Azul Contente
10. Manhã de Carnaval
11. Aruanda
12. A Minha Namorada

Pra quarta feira de cinzas, fim de Carnaval, ressacas e afins, a bossa-nova, subgênero do samba cai bem pra relaxar e ouvir boa música. Ainda mais, quando essa música é feita e reiventada por um trio de peso, composto por Edison Machado na bateria, Dom Salvador no piano e Sérgio Barroso no contrabaixo. O conjunto é o Rio 65 Trio, formado por Dom Salvador no nascedouro do samba-jazz: o Beco das Garrafas, no Rio de Janeiro; e o ano é 1965, época em que a bossa nova, criada na “Cidade Maravilhosa”, estava no auge depois de um sucesso estrondoso nos Estados Unidos e Europa, capitaneada principamente por João GIlberto e Sérgio Mendes.

O disco homônimo – o primeiro dos dois que o trio lançou – é uma grande reflexo do momento de transição que vivia a música brasileira: releiuras de composições de artistas brasileiros como Tom Jobim, Luiz Bonfá, Baden Powell, etc; se misturam a composições do grupo, principalmente do exímio pianista (também importante para o início do funk feito no Brasil na década de 70) Dom Salvador. Além dessa mistura sendo executada por um trio típico de jazz (bateria, piano e baixo), formação que na época era introduzida na música brasileira e que ajudou a fazer a transição da mesma (mais precisamente do samba), o álbum realiza um ótimo diálogo entre as culturas negras de Brasil e Estados Unidos.
Pra ouí-lo, clique aqui!

Marcelo Monteiro (2012) – Marcelo Monteiro

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marcelomonteiro

1. Prana
2. Gengibre
3. Cardume
4. Praça da Sé
5. Espelhos
6. Alunde
7. Oriente
8. Samsara

Marcelo Monteiro é um músico e arranjador paulistano, com uma carreira de mais de 20 anos na música, e que acaba de lançar seu primeiro trabalho autoral: o disco homônimo que saiu ano passado de forma independente. Marcelo é mais conhecido por seu trabalho com Alfredo Bello_Dj Tudo e a percussionista Simone Sou à frente do Projeto Cru, que fez barulho no início dos anos 2000. Além do Projeto Cru, Marcelo Monteiro já tocou com vários artistas como Cumadre Fulozinha, Bixiga 70, Dj Tudo e Sua Gente de Todo Lugar, entre outros. Fez trilhas sonoras e também gravou pra outro punhado de artistas como Zezé Motta, Porcas Borboletas, Ortinho, Junio Barreto, etc.

Com toda essa bagagem, seu trabalho solo é uma grande viagem por ritmos e temas leves que caminham muito bem sobre os instrumentais das composições. Toda referência de sua formação como músico está no disco. O samba, funk, jazz e samba de gafieira são elevados à sua potência, sem deixar o virtuosismo – muito presente em trabalhos que exploram esses ritmos – sobressair. O trio, além de Marcelo Monteiro no saxofone e flauta, tem Daniel Amorim no baixo e Maurício Caetano na bateria.
Dá pra saber mais sobre o trabalho do músico em seu site e ouvir o disco que já foi indicado a importantes prêmios da música brasileira, clicando aqui!

Sexy 70 – Music Inspired by the Brazilian Sacanagem Movies of the 1970’s (2004) – Che

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1.Intro/A jeitosa do morro
2.Helena x Aldine
3.A babilônia de David
4.Desejos ardentes
5.Vinheta
6.Pixoxó em lua de mel
7.Vera, a diaba loira
8.Simplesmente Glória
9.Mulher objeto
10.Um Grapete antes, um cigarro depois
11.O eterno pecado horizontal
12.Suite para Peréio
13.Sala especial
14.Tá tudo errado porra!
15.Pixoxó remix
16.Babilônia dub version
17.Ainda te pego (bônus track)

Che é o codinome do produtor, compositor, arranjador, vocalista e multi-instrumentista paulistano Alexandre Caparroz, ex-integrante do grupo pop dos anos 90 Professor Antena. Este trabalho, lançado em 2004, é um tributo musical à pornochanchada brasileira dos anos 70. O disco conta ainda com participações especiais da atriz e musa dos anos 70 e 80 – Helena Ramos, e de Paulo César Pereio.  Bossa, funk, soul,samba, bolero tocados com o espírito boêmio, elegante e sedutor. Vale a pena conferir esse belo som, só clicar e ouvir!

Edison Machado é Samba Novo (1964) – Edison Machado

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1.Nanã
2.Só Por Amor
3.Aboio
4.Tristeza Vai Embora
5.Miragem
6.Quintessência
7.Se Você Disser Que Sim
8.Coisa Nº 1
9.Solo
10.Você
11.Menino Travesso

Mais uma pedra preciosa da música brasileira, e das grandes.  Disco do carioca Edison Machado –  um dos mais importantes bateristas brasileiros, e talvez também, um dos mais esquecidos. Criador de conceitos em seu instrumento, foi responsável por criar a condução de prato no ritmo do samba. Assim, “Edison Machado é Samba Novo” é um disco que tornou-se referência para bateristas não só no Brasil mas em todo mundo. E não era pra menos, além de Edison Machado na bateira o disco conta com Tenório Jr. no piano, Sebastião Neto no baixo, Paulo Moura no sax alto, Pedro Paulo no trompete, Raul de Souza e Edson Maciel no trombone e J. T. Meirelles no sax tenor. É uma seleção brasileira! Edison Machado foi mais um músico brasileiro que morou e fez fama nos Estados Unidos, onde tocou com grandes nomes do Jazz como Chet Baker e Ron Carter.

Confira o release da contra-capa do LP:  “EDISON MACHADO – Há alguns anos passados, ainda garoto, apareceu tocando bateria – já nessa oportunidade, era o Sr. Ritmo – suas inovações marcaram época e pela primeira vez se ouviu samba tocado no prato. Não tentaremos definir nem explicar a maneira de Edison tocar, porque sua sensibilidade e sua técnica não podem ser definidas, nem explicadas com palavras – e a prova clara do que afirmamos é o fato de que, quando Edison viajou pela Europa, entusiasmou os povos daquele continente, magnetizando-os com a magia do seu ritmo. Nos EUA, Edison tornou-se ídolo de todos aqueles que tiveram a felicidade de ouví-lo, principalmente músicos. Nessa onda, também entrou Discos CBS, fazendo seus técnicos observá-lo na “Boite Baccarat”, do famoso “Beco das Garrafas”, a fim de que fosse possível estudar sua maneira de transpor para disco aquele som inconfundível. Aqui está o microssulco em questão, que foi realmente muito difícil de gravar. O resultado, porém, valeu o sacrifício de todos aqueles que com tanto carinho tomaram parte no trabalho. Necessário se faz explicar que os arranjadores e instrumentistas, componentes do conjunto que acompanha Edison neste LP foram escolhidos dentre os maiores músicos nacionais, e são eles: Moacir Santos, Paulo Moura, Maciel, Raulzinho, J. T. Meirelles, Pedro Paulo, Tenório Jr. e Tião Neto.”

Agora é só clicar e deliciar-se com esse belo som!

Etiópia (2012) – Sambanzo

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1. o sino da igrejinha
2. xangô
3. tilanguero
4. capadócia
5. xangô da capadócia
6. etiópia
7. risca-faca

A música instrumental brasileira não para de lançar pedras atrás de pedras. O saxofonista Thiago França, músico muito solicitado e ativo nos últimos tempos, acaba de lançar seu novo trabalho; trata-se do disco Etiópia do projeto SambanzoO projeto teve início em 2009 com a gravação e lançamento de algumas músicas, mas segundo Thiago, o projeto ganhou mais corpo nos últimos tempos. E que corpo! O disco é uma mistura fantástica entre ritmos brasileiros, africanos, latinos, com uma alma jazz ao fundo. Nota-se temas relacionados ao samba de gafieira, gênese do projeto, só que evoluido ao experimentalismo reinante nas melodias sinérgicas do sax de Thiago, nas bases e loucuras da banda que o acompanha, acompanhando o experimentalismo que é uma das novas caras da música instrumental brasileira

O disco é uma evolução da música do próprio Thiago, e essa evolução caminha no mesmo sentido da música instrumental brasileira produzida atualmente, com temas mais simples (sem punhetagem) e muito melhor explorados, deixando ouvidos e execução mais livres pra passear entre notas, timbres,melodias e ideías originais. Os músicos do disco são: Marcelo Cabral (baixo), Kiko Dinucci (guitarra), companheiros inseparáveis de Thiago em outros projetos, Samba Sam (percussão), Welington Moreira “Pimpa” (bateria) e o próprio Thiago França (sax tenor). Todas as composições, execeto as músicas 1 e 2 são do saxofonista, e arte também é de Kiko Dinucci e a produção o disco é de Rodrigo Campos, grande compositor e do próprio Sambanzo.
O disco foi disponibilizado pelo próprio Thiago no site do projeto! Aproveite!!

Trocamos uma ideía com Thiago França, sobre Sambanzo, sua particpação em outros projetos, música instrumental e outras cositas. Se liga!:

Boca Fechada: O que significa Sambanzo? O nome também está na estética das músicas? Você lançou algumas músicas em 2010, já com o nome de Sambanzo. Como as vê e hoje e em relação à Etiópia?

Thiago França: “Sambanzo” é uma palavra que eu acho que criei, é a junção de SAMBA + BANZO. A tradução de banzo é a saudade que os negros (escravos) sentiam da África. Pesquisando no Google, descobri que existe uma cidade em Moçambique chamada Rio Sambanzo Pequeno. Quando criei o Sambanzo, no final de 2009, o samba era muito mais óbvio como matriz estética e melódica. Esse projeto é um desdobramento direto do meu primeiro disco, “Na Gafieira”. De lá pra cá a formação mudou bastante e o som também. Gravamos um primeiro disco, em 2009, que está engavetado por uma série de questões. As quatro faixas do SoundCloud são parte desse disco, que tem um total de 13 faixas. Escolhi essas quatro por achar que tinham mais a ver com o que a proposta se transformou pra lançar esse single.
http://soundcloud.com/thiagosax/sets/sambanzo/

BF: Você participa de diversos projetos com grande repercussão nos últimos tempos, e como músico soma com artistas importantes do cenário atual da música brasileira. Como isso influencia em suas composições e no Sambanzo?

TF: Cara, não sei te dizer. Cada projeto que a gente realiza tem vida própria. O Metá é bem próximo do Sambanzo por ter eu e o Kiko, mas ainda assim, são vidas paralelas dentro de um mesmo universo. O trampo do Romulo não tem nada a ver com o Sambanzo, Criolo,  MarginalS, nem com o “Bahia Fantástica “do Rodrigo Campos. O trampo do Criolo não tem nada a ver com Metá nem com o do Rodrigo. O processo de gravação do disco do Gui Amabis e da CéU, também não tem a ver com o Sambanzo, Metá, Rodrigo, Romulo ou MarginalS. O próprio MarginalS, que tem eu e o Cabral, não tem a ver com o Sambanzo. Entende? De alguma forma, acho que tudo isso conversa, mas estou muito dentro pra conseguir enxergar. Talvez, só seja possível daqui um tempo.

O que influencia o Sambanzo são os caras que tocam comigo, Pimpa, Samba, Cabral e Kiko. Eu componho pro Sambanzo, pensando neles, no jeito de cada um. Não adianta você fazer um músico tocar aquilo que ele não entende ou não sente, vai sair forçado. Então acaba rolando um lance meio “tecla SAP”, foco num tipo de composição, faço as músicas pra elas funcionarem com a nossa sonoridade e com o nosso jeitão de tocar. Não sou colecionador de músicas próprias, componho conforme a minha necessidade de tocar. E sem pressa, só desenvolvo uma idéia quando acho que é realmente boa, que possa acrescentar algo único ao repertório. Deixo as idéias azeitando, às vezes, por anos. Fica na minha cabeça um groove, uma frase, etc… e uma hora sai.

Quando eu me dedicava mais ao choro, era diferente. Pra fazer a noite, você precisa de 40 a 60 músicas. Eu compunha muito, mas tudo dentro do mesmo estilo. É um pouco limitado, os caminhos de harmonia são muito rígidos, clichês, e até as variações são clichês. No fundo, as melodias se parecem muito,  não que falte inspiração, mas todas elas têm o mesmo “sabor” porque a espinha dorsal de cada uma já tá pronta. Saca? Com o Sambanzo, eu fujo disso.

E muitas vezes, o que te impulsiona a compor é algo completamente improvável. Pela correria, distância, ou por falta de envolvimento dum músico com um projeto, é muito difícil conseguir ensaiar aqui em São Paulo. Isso me deixava um pouco frustrado. Além disso, eu ficava com raiva quando um músico esquecia a pasta de partitura e não dava pra tocar algum som. Por isso eu comecei a compor nesse esquema de dois acordes, pra não precisar de partitura nem de ensaio, meio de birra, é só chegar na hora e dizer: “ó, essa aqui é um , a harmonia é dó menor e sol com sétima”. E pronto! E foi assim o primeiro show do Sambanzo com essa formação que ficou, sem ensaio, sem partitura, tudo na hora.

BF: Você mencionou que tocou choro antes de enveredar pra esse tipo de musica mais livre, distante da partitura. Essa é uma característica da musica instrumental que vem sendo feita atualmente. Quando tocava choro percebia algum tipo de preconceito dos músicos do choro em relação a essa musica mais livre? Como você enxerga essa musica instrumental feita atualmente no Brasil?

TF: Quando eu tocava choro, samba e forró, sentia uma resistência grande do pessoal contra qualquer tipo de mudança, por menor que fosse. Esse gêneros são muito formatados, tanto pelo lado musical quanto pelo lugar onde acontecem. E existe demanda (ainda bem!) O que acontece é que, a maioria dos músicos começam a trabalhar muito antes de desenvolver a sensibilidade, sem nenhum questionamento artístico, duma forma bastante mecânica, usando modelos prontos. Não acho que era exatamente um preconceito, no sentido de não gostar de nada além daquilo, muitas vezes parecia preguiça, de “mexer em time que tá ganhando”. Assim, qualquer coisa além do formatado é desnecessário ou esquisito. Eu lembro que quando mostrei o EWI (Eletric Wind Instrument, uma espécie de sax MIDI que eu uso bastante no MarginalS), pro pessoal que tocava comigo, eles rolaram no chão de rir, achavam que eu tinha enlouquecido.

 Há uns dez anos atrás, quando todo mundo resolveu gostar de samba e choro de novo, e muito graças a ascensão do forró na classe média durante os anos 90, bastava tocar. A simples execução da música era um assunto. Hoje em dia, o próprio público já sacou que só isso não dá mais. Nesses dez anos, apareceu um ou outro cara tocando bem de verdade, mas tocando coisas que já foram entendidas há muito tempo, sem grandes contribuições. No balanço geral, os grandes caras continuam sendo o Cartola, o Noel, o Nelson Cavaquinho, Pixinguinha, Jacob… A coisa vai ficando cada vez mais engessada e o público cada vez mais ávido por algo novo, não no sentido consumista da coisa, mas no sentido de que as pessoas querem ser surpreendidas.
A música instrumental mais livre ganha cada vez mais espaço por ter frescor de ritmo, estrutura, melodia, harmonia, timbre, instrumentação, texturas e sobretudo dinâmica – caráter mal explorado em outras vertentes instrumentais. Você vai do silêncio ao caos! Há uma riqueza muito maior de nuances dentro de cada música e ela é muito mais visceral por não estar atrelada a nenhum modelo. Tá muito longe do rigor técnico da academia, tá mais próxima ao sentimento, duma vontade mais legítima de tocar.
A intenção, a postura, de tocar é outra também. Você vê os músicos muito mais envolvidos pelo som, rola um transe coletivo entre quem toca e quem ouve. E a gente se leva menos a sério, tem mais espaço pra experimentação. Coincidentemente, os sons instrumentais mais interessantes são feitos por quem veio do rock, do punk… com formações não tradicionais. Aos poucos, mais gente consegue se desvencilhar dos modelos padronizados de música instrumental, e da idéia de que o bom instrumentista é aquele que consegue tocar mais notas por segundo.
No Sambanzo, a elasticidade dos arranjos me interessa muito porque dá liberdade pra todo mundo criar, há mais espontaneidade, o som ganha vida e se torna único. Quando o músico está livre, é possível extrair o que ele tem de melhor.

Lançamento “Sambanzo: Etiópia” – Thiago França

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Thiago França, saxofonista que está em todas ultimamente, acaba de lançar um novo trabalho. Trata-se no disco “Sambanzo: Etiópia” Hoje tem lançamento no SESC Pompéia e semana que vem o disco tá por aqui!!

Serviço:

Lançamento do disco “Sambanzo: Etiópia – Thiago França
Local: Choperia SESC Pompeía – Prata da Casa
Quando: 13/03 (terça-feira) às 21hs
Entrada Gratuita

Ouve aí um pouco do Sambanzo!:

O Sino da Igrejinha
Etiópia