Arquivo mensal: setembro 2013

Apaixonado (1973) – Baden Powell

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capa1. Casa Velha
2, Alcântara
3. Igarapé
4. Estórias de Alcântara
5. Waltzing
6. Lembranças
7. Abstrato
8. As Flores
9. Balantofe
10.Brisa do Mar

A música brasileira está repleta de casos em que artistas fizeram mais sucesso fora do que no próprio país. Um exemplo dessa anomalia é o vilonista e genial Baden Powell, carioca nascido na década de 30, ano em que começava a ditadura Vargas no país, e período em que o samba ainda sofria na mão dos moralistas institucionalizados. Baden apareceu junto à bossa nova, movimento nascido em fins da década de 50 e que tomou grande proporção e fama na década seguinte. Detalhe interessante é que a bossa nova – mesmo com muito sucesso no Brasil – foi um dos movimentos musicais que mais aconteceu a tal anomalia do “santo de casa não faz milagre”.

Baden inicia-se junta a bossa mas, é um dos responsáveis por transformá-la e reiventá-la. Isso ocorre na segunda metade da década de 60, onde a denominada “segunda geração” do movimento (Eumir Deodato, Hermeto Pascoal, Edu Lobo e  Baden, dentre outros) conduziram-na à outros caminhos, intermediando um papo “mui bueno” com outros ritmos. Em Apaixonado, disco de 1973 (de um Baden bem maduro) isso fica evidente, pois os temas compostos por ele, vagam de pés firmes por toda música do mundo. Em toda singeleza que lhe é peculiar, notamos muita música brasileira: samba, frevo e bossa (claro!), envenenada pela música negra do mundo: o jazz, já existente em sua obra, pitadas de rock e blues, e dos recém nascidos soul e funk. (Interessamte notar a presença desses ritmos na música de Baden, mostrando quão antenado era um dos maiores guitarristas brasileiros).

Pra ouvir esse belíssimo disco. clique aqui! 

Cabeças que fazem Cabeças #2 – por Leandro Conejo

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Seguindo os trabalhos de renovação e novos ares do blogue, há cerca de uns 20 dias estreamos a série Cabeças que fazem Cabeças, que consiste em convidar alguém ligado à música de alguma forma, pra falar sobre um disco instrumental de sua preferência.
Pra segunda vez da sessão, convidamos o músico argentino Leandro Conejo, guitarrista que toca numa das bandas argentinas mais brasileiras  da atualidade: o Falsos Conejos, power trio de música moderna, que já lançou dois registros e ano que vem, chega com trabalho novo.
Leandro é amigo há alguns anos e sempre trocamos referências musicas (ou não) quando nos encontramos ou conversamos. Nada mais justo, colocar essas conversas em prática.
Pra vez dele aqui no blogue, foi escolhido um das obras mais fodas da história da música mundial. A grande: A Sagração da Primavera do russo Igor Stravinsky. Lá em 2009, no início dos trabalhos do Boca Fechada, a “Sagração” foi feita mas, como os anos passam, e a memória é curta, ela aparece aqui novamente, escancarada minuciosamente pelo belo relato de Leandro Conejo.
Vamos a ela, então!:

A Sagração da Primavera (1913) – Igor Stravinski – por Orquesta Nacional de Gales BBC, dirigida por David Atherton

RiteofSpringDancers

A Sagração da Primavera (original em francês , Le Sacre du printemps ) é um obra em dois atos (L’ adoração de la terre e Le sacrifício)), com música do compositor russo Igor Stravinsky e coreografia de Vaslav Nijinsky . É uma das obras mais revolucionárias da história da música clássica, por suas inovações em harmonia , ritmo e timbre . Foi realizado pela primeira vez em Paris em 29 de maio de 1913.

Na minha opinião , este trabalho é o início da época musical em que vivemos . É como um dossiê que apresenta as várias caminhos que a música transitou ao longo dos próximos 100 anos.

Digo isto pensando em dois planos diferentes . A mais óbvia e concreta , que é a influência sobre os compositores que ouviram o trabalho, tanto acadêmicos, populares de vários gêneros como jazz (Charlie Parker e Miles Davis), no Rock  (Jimi Hendrix) e Tom Jobim. Em outro nível, mais subjetivo e menos óbvio (que veio com base unicamente em conjecturas) , está relacionado com a maneira pela qual as principais características deste trabalho são refletidas na música que veio depois dele. Talvez isso foi premeditado; um prognóstico de Stravinsky com base nos resultados de uma análise da história da música e aposta posterior sobre os rumos que ela tomaria nos anos seguintes , ou apenas uma coincidência, perceptível por alguém como eu, que tem “o jornal na segunda-feira ” em suas mãos .

Vou destacar três características muito fortes e marcantes :

1: construção e destaque arquitetônico de ritmo e percussão.

2: A alegação da música popular.

3: A busca por novos timbres , alheio aos costumes de cada instrumento.

1 . Sobre o ritmo e percussão

Uma das características mais fortes de ” Consagração” é a importantancia , peso e densidade do ritmo. Até então, a música de tradição escrita, deu mais importância para a melodia e posteriormente a harmonia. O ritmo e seus principais aliados  ( osinstrumentos de percussão) foram relegados a uma função decorativa. Várias passagens da obra de Stravinsky são simplesmente golpes, quase como se fossem uma bateria de rock ou loops de música eletrônica, sem qualquer tipo de conteúdo melódico. Em outras ocasiões, há diálogo entre os diferentes grupos da orquestra, nesse diálogo, cada grupo toca uma frase curta soa isolado ou uma nota só, porém são extremamente valiosos quando todas essas frases se juntam para criar uma rede polirrítmica e polifônica complexa . Anos mais tarde, os músicos afro-americanos, deram o nome de “groove” para este conceito, elemento onipresente e essencial em toda a música do século XX. Do free jazz ao funk, do heavy metal ao minimal techno, bossa nova, samba e tango.

2. Na música popular

Outra característica é que , Stravinsky (influenciado pelas idéias de seu mestre Rimsky Korsakov) usa velhas melodias folclóricas russas como mot para o seu trabalho. Ou seja, música clássica estava fazendo um aceno para a música primitiva e pagã “das tribos”. Feito que se opôs a um processo de séculos , que vem de Bach, em que a música era o mais celestial possível, longe da terra, do suor e do sangue, como se fossem anjos. A coreografia é um exemplo muitivoo visual deste , em que os bailarinos apoiam as solas dos seus pés no chão, ao contrário do dogma do balé clássico em que todo mundo tem que andar na ponta dos pés , como se fossem anjos.
Este fato, além de ter relevância puramente musical, tem muito valor no aspecto cultural e sócio-econômico  da música do século XX. A criação e posterior sucesso comercial das gravadoras, e com eles, a música popular criada por compositores sem vínculo com o poder da igreja ou da nobreza, talvez seja o exemplo mais claro .

Até o século XIX , a música criada pelo compositor de formação clássica era ouvida pela maioria das pessoas. Estes compositores usavam o sistema tonal, onde uma nota regia as demais e todas as notas que não eram o mais importante, existiam em função da nota tônica, algo parecido com a “nota Deus” ou “nota Rei”.
No entanto, no século XX , a música que a maioria das pessoas ouvem (e consomem), vem de criadores não clássicos: The Beatles, Carlos Gardel, Tom Jobim, para dar alguns exemplos . Esse processo gerou que, aos poucos, as notas começaram a desfrutar de alguma igualdade, pois os compositores tiveram um pouco mais de liberdade musical. O jazz modal dos anos 50 e 60 , a música pop dos anos 80, são exemplos claros (mas que nao chegam a ser tão radicais como a anarquia da musica dodecafônica ou serial), mas sim, mais perto de uma espécie de democracia representativa. Além disso, a preocupação que tinham os compositores de não passar pela aprovação de seu patrono (sempre membros nobres ou poderosos da igreja ) hoje não existe, mas sim, se o mercado irá aceitar, ou seja, o trabalho deve ser aprovado pelo “povo” através do seu representante, o gerente de um gravadora.

3. Os timbres

Stravinsky começa seu trabalho com um instrumento que nunca havia assumido o papel de solista na orquestra, o fagote . Além de dar-lhe um papel de protagonista, ele deu ao instrumento um novo registro, executando melodias não comuns a ele. Essa escolha gerou um novo timbre na orquestra, que, às vezes, parece sons de guitarras e sintetizadores, tão comuns na música popular dos 100 anos que se seguiram a estréia de ” The Rite ” .

Esses três recursos, juntamente com outros, como o uso de “acordes híbridas” (acordes que não era nem maiores nem menores), fez esta peça revolucionária, alguns anos antes da eclosão da Revolução Russa .
Stravinsky usou pela primeira vez, recursos que agora soam familiar para nós, e deixou claro que esta obra nada tem nada a ver com o esnobismo de muitos artistas que buscam criar revoluções estéticas vazias.
E acima de tudo, feita esta análise fria, Stravinsky conseguiu capturar com genialidade e maestria emoções como o medo e a serenidade, alegria e ansiedade. E, do mesmo modo que acontece em nossas vidas, em questão de segundos e, imprevisivelmente, estes sentimentos se modificam e misturam-se, sem se importar se são, ou não, antagônicos.

Pra ouvir essa grande obra, clique aqui!

Esse vídeo é a filmagem de um ballet, dirigido por Pier Boulez:

Também recomendo a leitura de “Poesia Musical“, um livro baseado na palestra que o compositor estava em Harvard, que aborda vários de seus conceitos estéticos .

Além disso, este documentário :
Keeping Score : Sagração da Primavera de Stravinsky





Chorume da Alma (2011) – Pig Soul

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Capa1. Intro (11)3142212X
2. Chorume da Alma
3. Koentro
4. Raño
5. Romanza
6. L’Amour
7. Wa A Api Vini
8. Cocktail
9. Epílogo
10. Talking Waves

O release do Pig Soul, banda residente de São Paulo capital, já diz tudo: “Vale tudo. Da improvisação livre à nerdice dodecafônica e espectral. Tudo com a veia roquenrol dos integrantes, ligados ao Progressivo e ao Metal. É jazz, é salsa, é louco. Acima de tudo é Rock!” Resume bem: é louco e acima de tudo é rock! Um rock pesado, recheado de experimentações da primeira à última faixa. Em tempos que as bandas de rock tem postura e produção mais preocupadas com a imagem que a sonoridade, o Pig Soul leva o rock à outros terrenos, digamos que mais…fritos! Viaja com o jazz, rebola com o samba e mexe com a salsa mas, sem perder a ternura.

A banda paulistana é formada por músicos experientes que tocam ou tocaram (juntos ou não) em outros projetos mui interessantes – o Eletrogroove, banda formada em Campinas e que tem dois integrantes que hoje formam o Pig Soul é uma delas. Em 2011, lançaram seu único registro até então, o disco Chorume da Alma. As composições são densas e vagam com tranquildade nos ritmos citados. O “espírito de porco” de Daniel Brita (guitarra e trombone), Gustavo Boni (baixo), Luiz André “Gigante” (bateria) e Rafael Montorfano “Chicão” (sintetizador e piano) incorporou e remexeu a caxola no rock.
Pra ouvir essa pedrada, clique aqui!

Umbra (2013) – Herod Layne

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cover1. Penumbra
2. Collapse
3. Limbo
4. Blinder
5. Lumia
6. Silêncio
7. Antumbra
8. Umbra

Trazendo por aqui mais um lançamento da nova safra da música instrumental brasileira.  Já comentei anteriormente que o momento do gênero é muito massa no Brasil. Bandas novas surgem de baciada, discos são gravados com qualidade, e estilos musicais distintos dentro da música instrumental dão o tom do momento. Nesse contexto, ainda na primeira década do século XXI, na Babilônia pauista surgiu o Herod Layne. De início um trio, e posteriormente um quarteto, os caras acabam de lançar Umbra,  novo álbum que conta com diversas participações, maturou-se quase dois anos pra sair do forno e teve um belíssimo trabalho de produção.

A Herod Layne lançou em 2010 o disco Absentia, e de lá pra cá, além de diversos shows pelo Brasil, trabalharam na produção de Umbra.  O período que ficaram trabalhando no disco, rendeu um belo e formoso fruto. Umbra é um disco muito maduro. Calcado no post rock, pos metal, drone e noise, as experimentações do quarteto estão concisas e as faixas dão uma noção narrativa ao disco. As 8 faixas de Umbra estão muito bem  amarradas à temas soturnos e pesados que parecem nos levar aos lados e momentos sombrios de toda existência.

O disco foi disponiblizado na semana passada pra download, e você pode ouvi-lo, clicando aqui!

Pra coroar o lançamento de Umbra, trocamos uma idéia (via email) com o Herod Layne. Segue o papo:

Boca Fechada: Como foi o processo de produção de Umbra? Desde a idéia do crowd-funding, até o lançamento no ultimo dia 5?
Herod Layne: Umbra teve uma gestação de dois anos e alguns meses, se considerarmos as primeiras idéias e riffs criados. Na verdade, esse tempo longo se deve ao fato que, num primeiro momento, concebemos o álbum da maneira tradicional que sempre fizemos com os outros discos, e chegamos a um ponto de maturação suficiente para gravação da pré. Neste momento, criamos, desenvolvemos e disponibilizamos nossa própria plataforma de crowd-funding, o Buzzker, que nos trouxe bom retorno financeiro para seguirmos com um projeto ainda mais ousado: decidimos então não lançar o material gravado e envolver um produtor no trabalho. O Joaquim Prado, que já era nosso amigo de longas datas, surgiu na hora exata para topar esse convite. Aí foi quando de fato o Umbra que viria a ser lançado começou a tomar forma. O Joca desconstruiu não só os arranjos e as composições, mas a própria banda e seus equipamentos, e começou um processo minucioso de estudo e reconstrução com base no conceito do álbum. Foram levadas em consideração as influências musicais de cada membro, seus gostos em relação a timbragem e melodias, sua aptidão e conforto técnico com o instrumento e apetrechos… A banda se renovou e ressurgiu mais poderosa e pesada, quer seja em equipamentos ou idéias. Quando fomos para o estúdio gravar, os detalhes já vinham sendo discutidos e ensaiados havia tanto tempo que a gravação durou apenas 4 dias.

BF: Uma das diferenças de Absentia para o Umbra foi a entrada de Lippaus na guitarra. Além dessa mudança (ganhando mais em sonoridade e experimentações) quais outras modificações vocês percebem de lá pra cá?
HL: A entrada de um quarto elemento na banda era extremamente aguardada, pois a limitação de um trio, especialmente em apresentações ao vivo, é notória para bandas com um som pesado e carregado em arranjos como o nosso. E o Lippaus foi muito importante também na criação das músicas, complementando as composições com linhas melódicas inéditas para a banda ou mesmo trazendo das suas influências algumas idéias totalmente novas. O Joca foi outro fator transformador do grupo, pois o trabalho de coaching individual que aplicou em nós foi decisivo para moldar a pegada da nova Herod. Outra diferença foi o conceito fechado e claro para todos, sempre encarado como guia e pano de fundo para todo esse projeto, como se a cada momento soubéssemos exatamente o propósito de cada música dentro do conjunto da obra. Alguns veículos têm apontado que deixamos velhas influências de lado, mas não é verdade, pois influências apenas se somaram ao longo destes dois anos, nada foi subtraído, e hoje a Herod é uma banda intelectualmente e musicalmente muito mais madura.
Herod 02

BF: Me chamou atenção a participação dos vocais de Jair Naves, em Limbo e de Felipe Albuquerque em Blinder. Essas músicas originalmente já tinham a ideia de conter letras? Como escolheram Jair e Felipe?
HL: A idéia de convites inusitados sempre nos agradou, e quando compusemos “Limbo”, percebemos que a música era torta e esquizofrênica o suficiente para comportar os vocais do Jair. No final de 2011, abrimos um show dele em São Paulo, e ficamos maravilhados quando ele discursou ao público sobre a “coragem da Herod (então ainda Layne) em fazer sua música torta e incompreendida, por puro amor à sua Arte”. Ao final do show, agradecemos a ele e retribuímos com o convite para gravar os vocais. Mais de um ano depois, já na etapa final de gravação do disco em 2013, marcamos um ensaio para discutir o trabalho. Trocamos algumas idéias de referências, e o Elson indicou a ele um conto do Edgar Allan Poe chamado “O Poço e o Pêndulo”. Já na primeira tentativa de ensaio, a química rolou, e a banda era só sorrisos quando ouvimos o primeiro berro do Jair – o Sacha chegou a largar a guitarra para filmar aquele momento memorável! E no dia da gravação, dos três takes que fizemos, o que valeu foi o último, quando o Jair Naves já estava sem voz, rouco, urrando suas letras.
Com o Filipe Albuquerque foi um processo um pouco diferente, mas tão brilhante quanto o do Jair. A sua banda, Duelectrum, dividiu muitas vezes o palco (e os integrantes) com a Herod ao longo das suas histórias. Quando “Blinder” foi composta, a idéia seria que o Sacha mesmo cantasse as letras que escreveu. Porém, com a sonoridade que a música tomou após a reforma do Joca, percebemos o quanto o timbre shoegazer do Filipe caberia na música. Entregamos o texto para ele já com uma sugestão de linha vocal, mas ele a modificou completamente e tão apropriadamente que tornou a voz o principal elemento da música e enriqueceu demais o repertório do álbum.

BF: Lendo os comentários de uma das divulgações do Umbra, li uma coisa que me intrigou. Uma pessoa disse: “pena vocês terem nascido no país errado”. O que acham dessa afirmação e como é fazer música no Brasil no estilo das composições de vocês?
HL: Não podemos concordar que tenhamos nascido no país errado, afinal estamos indo muito bem na divulgação do nosso trabalho e a receptividade do público tem nos surpreendido positivamente. No entanto, o Brasil é indiscutivelmente um país de tradições musicais muito fortes, com vários estilos populares bem definidos, além de sofrer do monopólio das mídias de mainstream. Fazer música “experimental” neste cenário é um desafio muito maior do que seria submetê-la a um público mais aberto a novos sons, com cultura musical menos constituída. Quando fizemos uma turnê no Canadá, em 2009, pudemos perceber este fenômeno de perto já no momento em que agendamos os shows: bastaram poucos e-mails e tínhamos cinco apresentações garantidas em quatro cidades canadenses. O interesse e o conhecimento musical da platéia também foi muito marcante em nossas performances.
Lidar com as dificuldades no país dá um sabor especial ao nosso trabalho, e procuramos ver a coisa de uma ótica otimista: se levarmos meras 100 pessoas a um show da Herod, teremos a certeza que serão 100 espectadores extremamente interessados e conhecedores da nossa música. E o segredo para alcançar uma crescente exposição tem sido, indubitavelmente, a união e colaboração das bandas independentes para a criação e desenvolvimento de uma cena que vem tomando proporções muito animadoras.
Herod 04

BF: Vocês estão totalmente ligados ao selo Sinewave. Como enxergam o momento atual da música independente brasileira e acham que existe uma cena música instrumental no Brasil?
HL: Acho difícil definir uma cena instrumental no Brasil. Acho que acabaria tentando juntar bandas de diferentes estilos somente pelo fato de não terem vocalistas. É um critério frágil. Talvez dê pra teorizar uma cena experimental no Brasil, juntando bandas que procuram quebrar padrões, independente de terem vocais ou não. Nesse sentido, dá pra dizer que existe sim, e a Sinewave meio que tenta jogar uma luz e indicar um caminho. Quanto à música independente em geral, acho que o momento é parecido com o que rola no resto do mundo – um desequilíbrio de oferta muito maior que a demanda. Tem muito mais bandas do que público interessado. Isso torna a sobrevivência de uma banda quase impossível sem um bom emprego bancando as despesas. Mas artisticamente falando, o momento é ótimo, e a quantidade de ótimas bandas sempre aumenta.

Percepção (1972) – Eumir Deodato

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capa1. Dia de Verão
2. A Grande Caçada
3. O Sonho de Judy
4. Adeus Amigo
5. Bebê
6. Nenê
7. Barcarole
8. Serendipity

Eumir Deodato dispensa comentários e apresentações. Um dos músicos e arranjadores mais aclamados da música popular – mesmo fazendo mais sucesso nos Estados Unidos do que no Brasil – começou sua carreira na década de 60 junto à bossa-nova, que  na época vivia seu auge e também fez parte da importante transição da bossa nova para o samba jazz em fins da década de 60.  Sempre como músico e arranjador, foi nessa condição que foi para os Estados Unidos como contratado da CTI Records, trabalhando com grandes nomes da música do país como Aretha Franklin e Frank Sinatra.

Chancelado como um músico talentosissímo, a partir da década de 70 começa a lançar seus discos solo. O primeiro dessa fase foi Percepção, gravado no Brasil pela gravadora Odeon, em 1972. Podemos dizer que é um disco abre-alas para o trabalho solo de Eumir Deodato. Percebemos em Percepção a influência da música produzida por ele na década de 60: bossa e samba jazz, fazendo elo com o que produziria nos Estados Unidos na década de 70: um jazz fusion e funk de responsa. Esse diálogo de períodos distintos é feito por melodias e aranjos de cordas e metais suaves, que nos levam a sensações nostálgicas e bucólicas. Se essa foi a intenção de Deodato (como parece ser, devido a bela capa do álbum) ele conseguiu com maestria. Belo disco!
Pra ouvi-lo, clique aqui!

Cabeças que fazem Cabeças#1 – por Rafael Cab

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Reformular, respirar novos ares, experimentar é sempre importante pra nossas ações tomarem outras formas e chegarem a mais pessoas.
Pesando nisso, estreiamos hoje uma nova sessão: “Cabeças que fazem Cabeças”.  A idéia nada mais é que convidar um músico, jornalista, produtor ou simpatizante da música instrumental pra esmiuçar um disco escolhido pelo próprio.
Pra estréia da ideia convidamos o baterista Rafael Cab, procedente de Santo André/SP, músico de vários projetos  (instrumentais ou não) e que também trabalha na área de produção cultural, através do Coletivo Marte.
Vamos à escolha do parceiraço:

Angels and Demonst at Play / The Nubians of Plutonia (1993) – Sun Ra e Myth Science Arkestra
CapaA1. Tiny Pyramids
A2. Between Two Worlds
A3. Music From The World Tomorrow
A4. Angels And Demons At Play
B1. Urnack
B2. Medicine For A Nightmare
B3. A Call For All Demons
B4. Demon’s Lullaby

Aceitei o convite do meu irmão Du pra chegar por aqui e postar um disco, então vamos lá:

Nosso grande amigo Sun Ra e sua (nessa ocasião) Myth Science Arkestra ainda não tinham passado pela área, e como temos trocado muitas ideias esses dias resolvi transmitir o recado da rapaziada pra frente.
Vou falar de um disco só, mas no post você ja descola logo 2 numa tacada (Angels and Demons at play / The Nubians of Plutonia).

Angels and Demons at Play foi originalmente lançado pela obscura El Saturn entre (1963-1967) selo dos próprios Sun Ra e Alton Abraham, que gravavam, produziam, arranjavam, faziam as artes e tudo mais que o role pedia desde 1957 (acho louco imaginar a cena dessa galera nessa época). O disco saiu com 8 faixas, gravadas em sessões diferentes e em anos diferentes, o lado A com músicas de diferentes momentos dos ano 60, no lado B não encontrei muitas informações sobre datas, mas parece que são gravações anteriores, final dos anos 50.

Não sinto a necessidade de uma resenha do disco, quero mesmo é partilhar e cada um que se entenda com a rapaziada da Arkestra. O que posso dizer, de forma mais pessoal, é que o disco me chamou a atenção pelas sobreposições rítmicas do lado A, sempre que ouço imagino um cenário industrial tosco, talvez uma transição entre uma fundição e uma linha de produção. Mas o lado B já é completamente outra história, frenético, esses sons tocados num boteco deviam deixar todos arrebentados, os temas e solos dos sopros são intensos.

Uma aula de como se conectar com a música e seus fluxos cósmicos. Ouça!

Produção – Alton Abraham.

Sun Ra & His Myth Science Arkestra:
Saxofone Alto, Flauta – Marshall Allen
Saxofone Tenor, Sinos – John Gilmore
Saxofone Barítono – Charles Davis
Saxofone Barítono, Saxofone Alto, Flauta – Pat Patrick
Trombone – Julian Priester, Nate Pryor
Trompete – Art Hoyle, Phil Cohran
Contrabaixo acústico – Ronnie Boykins, Victor Sproles
Contrabaixo elétrico – Wilburn Green
Piano, Orgão, Piano elétrico, Percussões – Sun Ra
Timpano, Timbales – Jim Hearndon
Bateria – Robert Barry

Horizonte#1 (2013) – Aos Maníacos Símeis

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cover1. NNO
2. NO
3. ONO
4. Off-Off #1
5. OSO
6. SO
7. SSO

Desde a virada do milënio e a maior democratização no acesso aos bens de produção em música,  em todos os cantos do mundo, e claro, do Brasil, surgem artistas e bandas dos mais diversos gêneros. Com a música instrumental não é diferente. Nesses 13 anos de século XXI, muitas bandas do Brasil todo surgiram para o cenário, e uma das cidades que mais se destaca nesse gênero é São Carlos, no interior de São Paulo. Localizada a cerca de 240km da capital, a cidade é marcada por ter originado ou hospedado diversas bandas importantes da música instrumental brasileira mais recente: Pantomine Jazz, The Dead Rocks, Malditas Ovelhas! e Aeromoças e Tenistas Russas, são bons exemplos.

Cria desse movimento interessante feito na cidade, o Aos Maníacos Símeis, na ativa desde 2010, lançou a pouco seu primeiro registro: o disco Horizonte#1, pelo recém criado selo Caesar Simia Records. O registro é um bootleg divido em 7 faixas e gravado ao vivo.  É como uma fotografia do grupo, já que as faixas são de total improviso. O Aos Maníacos Símeis, mais que uma banda é um coletivo de improviso, e as “músicas”, assim como seu show, dificilmente serão ouvidos novamente. Os improvisos de Horizonte#1 indicam os elementos que compõe o laboratório símio maníaco: post rock, noise e experimentações lo-fi com timbres, pedais e osciladores.
Interessante trabalho desse coletivo instrumental, que podemos ouvir, clicando aqui!